Juiz contesta liberação de bingos no Rio Grande do Sul

Destaque I 31.01.17

Por: sync

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Decisões de três juízes gaúchos abriram uma brecha para o funcionamento de bingos no Estado e lançaram novas cartas no polêmico debate sobre a liberação da atividade. Em uma série de acórdãos, magistrados da Turma Recursal Criminal do Tribunal de Justiça (TJ-RS) têm desclassificado a exploração como contravenção penal ao considerarem que a lei de 1941, que proíbe o jogo, fere princípios da Constituição de 1988.

Foi a partir de uma dessas decisões que Sérgio Garcês resolveu reabrir o bingo Coliseu e Roma, em Porto Alegre. Além da decisão judicial, os empresários do setor contam com o fato de que a medida provisória de 2004, proibindo os bingos, caducou e perdeu efeito, criando um limbo jurídico. Embora defenda a tese de que a exploração do jogo não é ilícita, o juiz Edson Jorge Cechet, presidente da Turma Recursal Criminal do TJ- RS, entende que o Coliseu e Roma não pode se considerar legalizado:

– Não me parece que esteja de acordo. Para um estabelecimento comercial funcionar, tem de haver lei federal ou medida provisória autorizando. Não dá simplesmente para dizer que aquilo que não é proibido passa a ser permitido. Ao mesmo tempo, não quer dizer que a pessoa possa ser presa e condenada por essa conduta – destaca Cechet.

Mesmo que não signifiquem a liberação do jogo, os despachos do TJ-RS deram margem a interpretações, uma vez que suspendem ações criminais contra réus que exploram a atividade clandestina. Mas no mesmo ritmo em que os magistrados absolveram réus, o Ministério Público (MP) recorreu das decisões ao Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais, Fabiano Dallazen, a Corte manteve o entendimento de ilegalidade em 16 recursos. Diante das repetidas ações sobre o tema, os ministros decidiram que será feita uma análise no plenário, ainda sem data para ocorrer, com decisão válida para todos os casos semelhantes.

Enquanto isso, o Coliseu e Roma atua para manter as portas abertas. Em entrevista ontem, o advogado Laerte Gschwenter apresentou acórdão do STF de relatoria de Dias Toffoli. Em agosto do ano passado, o ministro não atendeu a recurso que pedia revisão de decisão do TJ-RS que descriminalizava a exploração do jogo. O autor da ação, um sócio do Coliseu e Roma, não teve o nome divulgado.

Entrevistas:

“Existe preconceito e uma visão errada sobre o jogo”

SENADOR CIRO NOGUEIRA (PP-PI) – Autor de projeto que legaliza jogos de azar

O senhor apresentou projeto para a liberação de bingos e cassinos, atualmente na CCJ da Câmara. Por que liberar?

O Brasil é um dos países onde mais se joga no mundo. Para cada R$ 3 jogados no país, R$ 2 são de forma irregular – isso sem contar o jogo online, que não tem nem como mensurar. É um dos poucos países do mundo que ainda não regulamentou essa questão. Hoje, já se joga no país. Então, o projeto não vai liberar o jogo, porque o jogo já existe hoje no país. O projeto vai regular algo que já existe.

O assunto envolve uma série de polêmicas, com apoiadores e críticos apresentando cada um argumentos consideráveis. Mesmo assim, o senhor acredita na aprovação?

Sim. Há resistência porque existe preconceito e uma visão errada sobre o jogo, por causa da época em que era comandado por criminosos. Hoje, o jogo em todo o mundo é comandado por grandes empresas. Não existe mais esse tipo de atuação criminosa. O criminoso existe, na forma ilegal, como um Carlinhos Cachoeira da vida. Temos de regulamentar para que grandes empresas possam investir no Brasil, que vai receber bilhões de dólares em investimento.

No RS, há decisões judiciais que caminham na direção do seu projeto, uma vez que desclassificam o jogo como contravenção penal. Qual a sua avaliação?

Pelo menos, as pessoas estão indo atrás da Justiça. Vejo como um avanço, porque atualmente esses estabelecimentos funcionam de forma irregular. O problema é: para onde está indo a arrecadação desses jogos? Por isso, tem de ser regulamentado.

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“Entendemos que deveria permanecer ilícita a conduta”

LUCIANO VACCARO – Coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do MP

Por que o MP se opõe às casas de jogos?

Estamos diante de um ilícito penal. Há uma contravenção prevista pelo artigo 50 da lei de contravenções penais, de 1941. Essa lei não foi revogada. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) já validaram diversas operações no Brasil contra esse tipo de contravenção.

Além dos aspectos da lei, o MP é contra o jogo de azar do ponto de vista da sociedade?

O Congresso pode legislar, pode vir uma lei que legalize os jogos, que revogue a contravenção, mas isso ainda não aconteceu porque é um tema complexo, são vários interesses envolvidos. De um lado, os argumentos pró, de uma gama enorme de empregos a serem criados e pagamento de impostos. Por outro lado, temos as pessoas que se viciam no jogo e isso acarreta até doenças psíquicas. E temos indícios e estudos que apontam muito fortemente que as atividades do jogo do bicho e dos bingos são propícias à lavagem de dinheiro. Nesse ponto, entendemos que deveria permanecer ilícita a conduta.

As decisões do TJ-RS dizem que explorar jogos não é contravenção. Ao mesmo tempo, a medida provisória de 2004 que proibia os bingos perdeu a validade. Nesse limbo, o Coliseu e Roma abriu acreditando estar amparado legalmente. Como avalia?

Ao meu juízo, é uma interpretação equivocada (do bingo). Nada impede que a polícia volte lá para apurar novas infrações penais, com possível recolhimento de dinheiro e maquinário. Em nenhum momento a Turma Recursal decidiu que os bingos podem funcionar. (Zero Hora – Cadu Caldas, Carlos Rollsing e Debora Ely)

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